Frango, polenta e refugiados

Era para ser um passeio rápido, intervalo entre avião e trem arrastando mala e mochila por alguma calçada histórica tirando foto de monumento pombo vitrine restaurante. Gênova é um Rio de Janeiro sem Pão de Açúcar nem Copacabana, uma cidade que despenca morro abaixo e acaba no porto.

Desembarquei na estação central, atravessei a praça sob o olhar da estátua de Cristóvão Colombo e desci a via Balbi, onde fica o Palazzo Reale, construção de 1.618, auge dos anos dourados da cidade conhecida como Porta da Europa. À direita fica o complexo do porto novo. Um amontado de contêineres com 300 mil toneladas de óleo e vinho despachados anualmente da Itália para o mundo. À esquerda, o porto antigo, transformado em um complexo turístico que inclui restaurantes, lojas, um aquário e um museu. Imigrantes africanos ao celular vendendo quinquilharias.

Esfregando os olhos para espantar o sono, entro no Museo Galata Al Mare. Construído em 2004 para celebrar a história marítima da cidade, o museu possui um andar inteiro dedicado à história da imigração. E aqui o passeio virou pesquisa e terminou com eu chorando encostado no parapeito do terraço do museu.

Em 1.902 meus bisavós partiram deste porto para o Brasil. Giuseppe, 28. Concetta, 25. Maria Bernarda, 3. Filomena, 2. Miro o ponto de onde embarcaram e faço um esforço para imaginar como chegaram até Gênova. As colinas, terras e parentes que se distanciavam e o mar, o futuro e o Brasil (lugar de maravilhas). O sentimento flutuante entre saudade e medo antecipados.

Ou então não havia tanta saudade assim. O destino final era uma fazenda no interior de São Paulo. Pobreza por pobreza, a terra aqui era boa para milho: devem ter engolido a saudade com polenta e foram cuidar da vida, que logo nascia minha avó Emília (com quem pouco convivi e cujas lembranças incluem o frango com polenta quando eu a visitava).

Na volta à São Paulo, conheci o cozinheiro Mazen Zwawe, sírio, filho de palestinos, uma ascendência que não facilita nada sua obtenção de vistos. Mazen tem 28 anos, a idade em que meu bisavô Giuseppe chegou aqui. Pergunto a ele o que sabia do Brasil antes de embarcar: “Futebol!”. Ou seja, chega tão enganado quanto meu bisavô italiano que esperava maravilhas. Mas Mazen já tem seu próprio negócio e, em uma hora de conversa, não falou de saudades.

Neste dia 21 de fevereiro, às 19:30, no SENAC Aclimação,  Mazen Zwawe e Marisa Ono (filha de imigrantes japoneses) e eu vamos contar nossas histórias e falar sobre comida de imigrantes. Vagas limitadas e inscrições no site do SENAC.

umlitrodeletras

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